domingo, dezembro 04, 2011

Notas ao Latim Macarrónico (Regras de Uso)



Mas não é apenas aí que se regista a enorme catadupa de calinadas e de erros no uso do dito latim macarrónico (que em certos casos não passa de “latim de macarrão”), por parte dos praxistas.

Não basta, com efeito, acrescentarmos “ae”, “um” e afins, a palavras portuguesas, para estarmos perante latim macarrónico.

O conhecimento e domínio, pelo menos mínimo (saber umas coisas de declinações e conjugação), de latim são exigíveis, dado que várias fórmulas e chavões o devem ser em latim puro, alternadas com o macarrónico, num exercício que não deixa de ser literário, mesmo se jocoso, demonstrando que para se brincar com as coisas é preciso dominá-las q.b.
E recorde-se que, actualmente, com os meios disponíveis, algum tempo dispendido na web permite encontrar algumas soluções e informações sobre o assunto.

Uma outra coisa que convirá esclarecer é que, em Praxe, se permite o uso de termos na língua vernácula (Português, neste caso), embora de forma isolada e sempre que o termo latino (ou a expressão/frase) impeça o entendimento (nomeadamente nos decretos – que se pretende que sejam percebidos por qualquer um que os leia). Nem sempre, pois, é preciso fazer macarrão, quando podemos lá ir com um pouco de esparguete. Mas, uma vez mais, atente-se que se trata de algo pontual, de palavras isoladas.
Do mesmo modo se deve atentar às invenções a metro. Veja-se, a título de exemplo que, querendo escrever-se "velho(a)" ou "velhíssimo(a)" em latim macarrónico, em caso algum se pode redigir algo como "velhissimae", sendo obrigatório, neste caso, procurar o termo latino (similar ou equivalente), como "Senex-senis", "Vetus-veteris", "Antiqua-antiquae", "Decanus-decani".......... escolhendo o termo mais apropriado, segundo o contexto.

Outro exemplo é o termo "Invitatis" que em algumas academias é usado para designar  convite (embora, em Praxe, não se perceba a lógica e historicidade de tal - mas é mais uma daquelas invenções de meia-tigela feita por praxeiros de outra metade.....da tigela).
Ora o termo correcto seria "Invitatio", como substantivo, e não "Invitatis" que é uma forma verbal (2ª pessoa do plural, no presente do indicativo).

Também é comum vermos escrito (e não é de agora - existem decretos escritos há décadas, a conterem esse mesmo erro) "in nominae soleníssima praxis", contudo a expressão correcta é "In NOMINE solenissimae praxis".
Maior erro é vermos "in nominae solenissimae ad semper potentissimae praxis", pois, com efeito, "ad" significa "para". Ora, querendo usar-se a conjunção "e" (em nome da solene e sempre poderosa praxe...", deve usar-se "In NOMINE solenissimae ET semper potentissimae praxis".

O mesmo dizer do termo "Facultis", usado no Porto para os denominados "Dux Facultis", quando o termo adequado seria "Facultatis" (do termo Facultas), no genitivo (que determina a posse ou origem).
O mesmo dizer do termo "Informatis" (supostamente a querer ser sinónimo de Edital - ou coisa que o valha), que se deveria escrever "Informatio" (de "Informatio-informationis"),  e onde, mais uma vez, se usa (erradamente) um verbo em vez de um nome/substantivo. O termo mais apropriado seria algo similar ao "Decretus", como "Editu" ou "Editus".
Passo agora a citar um belíssimo post do ilustre Eduardo Coelho, precisamente sobre algumas regras de uso, com algumas dicas a levar em linha de conta por todos os que se aventuraram neste, nem sempre fácil, exercício de escrita.

Uma nota ainda, sobre o "Decretus", muitas vezes, e erradamente, escrito "decretum".

“Ainda não há muito tempo, o latim era a língua universal da ciência. Há razões históricas para isso (o facto de o latim ter servido como língua comum aos países que emergiram do fim do império romano), mas também razões de ordem prática (o facto de o latim ser uma língua extremamente lógica).

 Nas universidades, tal como hoje se publica tudo em inglês, tudo se publicava em latim. Era uma forma prática de divulgar ideias e partilhar ciência.
Os diplomas, os impressos, as fórmulas de juramento, etc., eram em latim.
Não é de estranhar que os estudantes começassem a gozar com o latim, adulterando-o para obter efeitos cómicos.

 O latim macarrónico é uma adulteração do latim: usam-se as regras do latim, mas "falsifica-se". Quando se usam  palavras portuguesas que o latim não contempla (ou torna difícil o entendimento e adequação) aplicam-se ao termos portugueses as terminações próprias do latim - seja em substantivos, seja em verbos, etc, observando-se, contudo, as regras da gramática latina, quanto aos sufixos adicionados (as terminações adequadas à declinação para substantivos ou para as conjugações).


Claro que a maioria dos actuais alunos não sabe latim. Tem vagamente a ideia de que há terminações "ae", "us", "um" que parecem latim. Não é bem assim. O latim macarrónico é extremamente exigente. Para se perceber a piada, é preciso perceber de latim a sério. Mas isso era dantes.

Se a praxe evoluísse, então hoje o lógico seria o "inglês macarrónico". Já que tudo é em inglês... Mas isso são contas de outro rosário.
Evidentemente, não há aqui lugar para um curso de latim, mas vou procurar responder [a algumas dúvidas correntes]:

Em latim, a terminação "ae" podia ser:

 - o plural das palavras terminadas em "a"; por exemplo, o plural de "caloira" seria "caloirae" (não "caloiras");
- o determinativo de posse de palavras terminadas em "a"; por exemplo "da academia" seria em latim "academiae"



A terminação "um" podia ser:

 - a terminação normal de palavras que em português terminam por "o", mas que são por sua natureza de género neutro - p. ex. "templo" em latim era "templum" (o templo não é "homem" nem "mulher"); assim, "cimento" seria, em macarrónico, "cimentum"; "vinho" / "vinhum"; etc.

 (o plural destas palavras em latim formava-se com "-a": templUM (o templo)/ templA (os templos))


A terminação em "-i" podia ser:

 - plural dos nomes masculinos terminados em "us": "decanus" (o decano); "decani" (os decanos); "semiputus" (o semiputo) / "semiputi" (os semiputus)

NOTA: "caloiro" não tem sexo; como tal, em boa regra macarrónica será "caloirUM" (a terminação em "-us" é para o masculino...) - o plural macarrónico correcto é "caloirA" (os caloiros) (tal como templum/templa) - :)


A terminação em "_arum" / "_orum":

é, respectivamente, o determinativo de posse plural dos nomes terminados em "a" ou "us":
"pastA" (a pasta) / "pastARUM" (das pastas); "fitA" (a fita) / "fitARUM (das fitas);

 "veteranUS" (o veterano) / "veteranORUM" (dos veteranos); "caloirUM" (o/a caloiro/a) / "caloirORUM" (dos/das caloiros/as)

 daí "consilium veteranORUM" - conselho DE VETERANOS.

Claro que fica IMENSO por dizer (…).

Por exemplo: nunca se devia escrever "DecretUS", mas "DecretUM" (já que um decreto não é homem nem mulher).
(….)"

In Fórum Praxe Porto , artigo de 14 Novembro de 2011.

5 comentários:

Sir Giga disse...

Olá JP,

ora vê lá este:

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1770114452385&set=t.100000851442587&type=3&theater

J.Pierre Silva disse...

Já vi, meu caro.
Não é da piores redacções que vi (bem pior temos nos decretos do Conselho de Veteranos da UTAD).
Mas obviamente que há ali bastantes "invenções".
Mas mesmo assim, não está muito mau.

Anónimo disse...

Caro WB verifico no N&M o seguinte tópico “Na saga - o nome da tuna”, gostaria de saber especificamente a que se refere, presumo que o mesmo diga respeito a uma futura publicação do Autor, bem sei que “depressa e bem, não há quem” sendo assim – e se a minha “suspeita” se confirmar – aguardarei pela publicação final, um abraço Paulo

J.Pierre Silva disse...

De facto, Paulo. A obra em causa está em destaque, do lado direito do blogue. Está no prelo, aguardando que a editora publique (a qual está assoberbada com a época natalícia).
"Na saga de O Nome da Tuna", porque é uma contínua procura das suas origens e indiosincrasias, que não se esgota na obra a ser publicada.
Já faltou mais. Está quase aí.
Abraço.

Anónimo disse...

Boa Noite! Será que me podia ajudar? Precisava de escrever "excelentissima senhora doutora aceita ser minha madrinha?" em latim macarronico, e ainda nao percebi muito bem como funciona... Agradecia toda a ajuda possivel!! Obrigada