Hoje
debruçamo-nos sobre essa moda, a ganhar contornos de histeria colectiva, que
pegou de norte a sul do país, de arrancar as etiquetas do traje académico com o
pretexto de ser praxe, de ser obrigatório ou próprio à Tradição.
Pasme-se,
caro leitor, que a suprema estupidez atinge os mais altos limites, quando
verificamos que tal vem consagrado, inclusive, em códigos ditos "da Praxe". Sim, sim, falo exactamente dessa treta de documentos que são o
registo inequívoco da incompetência praxística dos estudantes (quando deveriam
ser o contrário).
Como
dissemos, anda-se agora a perseguir, qual "caça às bruxas", as
etiquetas do traje, havendo até quem tenha a distinta lata de passar revista ao
interior do traje dos estudantes.
Pois
é verdade, lamentavelmente (quando é absolutamente proibido em Praxe e pela lei da República).
É
só mais uma argolada a somar a outras do género, a lembrar o que há uns anos
largos sucedeu pelos lados da Universidade de Aveiro, em que diziam aos
estudantes que tinham de usar a roupa interior com logótipo da Associação
Académica (que a própria venderia: boxers, t-shirts, meias....) ou então o que
ainda até há pouco tempo (hoje já não, creio) sucedia no ISEL, em que o código
determinava a proibição do uso de soutien preto.
Claro
está, que tudo isto releva de ridículo papismo e exagero e que de Praxe nada
tem, e muito menos de senso.
Mas
mais: há, em certos "burgos" quem faça da revista ao traje uma
espécie de prova, de teste, podendo inclusive chumbar na praxe se a avaliação
for negativa.
Mas
como pode um burro vestido de traje certificar a conformidade do porte correcto
de outrem, ao violar dolosamente a própria Praxe, quando vai além do permitido?
E
que autoridade tem seja quem for para "chumbar" ou
"reprovar" alguém em praxe? Mas anda tudo doido?
Mais
adiante explicamos esse erro de revistar pessoas dessa forma.
De
toda a maneira, sobre essa perfeita idiotice anti-praxe de avaliar pessoas em
praxe, o melhor é lerem AQUI.
QUAL A RAZÃO AVANÇADA PARA
PROIBIREM ETIQUETAS?
Quem
ainda se pergunta por que razão se anda a proibir o uso de etiquetas e a mandar
que seja retiradas tem resposta simples:
Alegam que sendo o traje para igualizar os estudantes, as
etiquetas estão a ir contra essa ideia, e por isso é preciso retirá-las.
Terão todos esses idiotas de explicar como é que as etiquetas sequer diferenciam os estudantes quando não estão à mostra! Hão e explicar esses idiotas praxistas como garantem que todos os seus doutores pagaram o mesmo pelo seu traje, de modo a garantir a tal igualdade e paridade que tanto almejam (e podem começar a fazer isso com os telemóveis também - que estão sempre à vista).
A VERDADE E OS FACTOS
O MITO, A MENTIRA DO TRAJE
IGUALIZADOR
É
pois o argumento do traje que serve para tornar todos iguais que serve de
pretexto para atacar as etiquetas, estejam elas à mostra ou não (para alguns
importa é perseguir e pensar depois).
Uma
vez mais, e por mais que tentemos desmistificar, ainda encontramos gente que
parece viver num enclave onde se alimentam de ignorância e parecem impermeáveis
ao saber e ao mundo que os rodeia.
Assim,
ainda há quem defenda e ache que o traje existe para igualizar os estudantes,
para impedir diferenças entre ricos e pobres.
Mas
na verdade, o argumento está errado:
O
TRAJE NÃO SERVE PARA IGUALIZAR E NUNCA TEVE ESSE PROPÓSITO.
Já
o comprovámos aqui neste blogue e por isso escusamos aqui repetir o conteúdo.
Podem
aceder à explicação cabal, clicando AQUI.
Se as etiquetas eram tiradas com base no
argumento nivelador e de igualdade, pois fica sem tapete para se manter de pé e percebe-se que não há fundamento a não ser burrice, estupidez e tacanhez.
De
acordo com o que comprovamos sem margem para dúvidas, e como Eduardo Coelho dizia
sobre a questão, "seguindo a lógica
formal de Aristóteles, de uma premissa errada não se pode extrair uma conclusão
verdadeira".
Ora se a premissa "O
traje serve para igualizar os estudantes" está errada, pelo que o resto do
raciocínio, por mais bem elaborado que esteja, assenta num princípio errado -
logo só pode chegar a uma conclusão errada.
O ERRO DE REVISTAR O TRAJE NA
PROCURA DE ETIQUETAS
Como
atrás prometemos, vamos agora lá pensar sobre essa coisa de revistar o traje e
do abuso que é revistar o seu interior.
Sendo
o Código de Praxe de Coimbra o mais antigo (data de 1957), estará, por isso,
mais perto da fonte que o inspirou, o mesmo se passando, no caso do Porto, para
o projecto de código assinada por Balau e Soromenho, em 1983, com base no de
Coimbra, o que dizem eles?
- Sobre passar revista ao traje - proibem determinantemente revistar o interior do traje, apenas sendo permitido revistar o que está á vista e sem tocar.
- Arrancar etiquetas - Nada referem. Por isso não é da Praxe ou Tradição a obrigação de arrancar as mesmas. Não proíbem que se tire, mas não apoiam que se arranquem com a justificação de ser Praxe.
E
se quisermos recuar aos documentos de cariz "normativo" anteriores ao
Código de 1957, nenhum deles refere a permissão de revistar o interior do traje
(proíbem-no, aliás) e muito menos que é da praxe arrancar etiquetas ou sinais
visíveis e diferenciadores entre trajes.

Mas
pode o leitor consultar o "Palito Métrico (1746) e Correlativa Macarronea
Latino-Portugueza (1765)", de Antonio Duarte Ferrão, (pseudónimo do padre
João da Silva Rebello), as "Leis extravagantes da Academia de Coimbra, ou
Código das muitas partidas", de Barbosa de Carvalho (1916), e "As
Praxes Académicas de Coimbra", de Dinis de Carvalho, Pereira da Mota e
Sousa Ribeiro (1925) que são reconhecidamente os documentos que registam a
praxis e suas regras ao longo da história. E faça o leitor igual com o "In Illo Tempore" de Trindade
Coelho ou qualquer outro documento de referência sobre Tradições Académicas.
Agora,
cito (uma vez mais) o meu ilustre colega de bancada aqui do N&M, o
professor Eduardo Coelho, a propósito da revista e da caça às etiquetas:
"Ora ninguém pode
revistar no traje de outrem mais do que lhe é dado observar sem tocar.
A praxe prevê uma dose de
reserva individual que não pode nem deve ser ultrapassada.
Esta questão do interior do
traje é um princípio mais antigo do que qualquer código. É pura questão de
bom-senso. Ninguém tem o direito de expor misérias alheias.
Ora se um indivíduo me
aparece trajado, partindo do princípio de que não aparece com a roupa vestida
do avesso, não tenho hipótese de ver-lhe as etiquetas. Ninguém tem autoridade
para mandar outrem tirar o traje - não há código que o sustente, defenda,
preveja ou autorize.
(...)
se as etiquetas não são
visíveis, não há forma de saber se o teu traje é mais caro do que o meu -a não
ser que, para ver as etiquetas do teu traje, eu violente primeiro um princípio
básico de praxe: a reserva da privacidade que nem mesmo um veterano pode
violar.
E eis a razão pela qual não
faz sentido arrancar as etiquetas.
(...)
Não está em causa o tirar ou
não, mas obrigar os outros a tirar e afirmar quer isso é praxe - e pior,
revistar os trajes dos outros à procura de etiquetas. Isto não só não é praxe
como é um atentado à própria Praxe. "[1]
Como
está bom de ver, não há base alguma que sustente o retirar das etiquetas como
sendo praxe, como sendo obrigatório ou aconselhável, muito menos ter a ousada estupidez de
revistar a roupa das pessoas.

E
pena é que sejam precisamente os líderes dos organismos de praxe e seus
ajudantes de campo os primeiros a alimentar a praxe não com rigor e exemplo de
saber, mas precisamente com a sua incompetência total e absoluta.
E o
resto dos ignorantes vão atrás disso, fiando-se naquilo que o colega, o amigo
ou veterano lá do bairro lhe diz (ou porque têm essa pessoa em boa conta, ou
porque ela têm o poder para impingir tal treta, na base da sua hierarquia),
porque vale mais o "diz que disse" do que provas sérias e
concludentes.
Uma
vez mais, são os organismos de praxe o veículo de disseminação dessa doentia
obsessão, promovendo-o e/ou permitindo-o, para vergonha de todos, desde logo
porque contraditório do nível intelectual exigido a quem cursa o ensino
superior.
-
NÃO, não é!
-
Então posso arrancá-las?
-
PODE, mas nunca por obrigação, por ser praxe ou norma.
-
Se me mandarem tirar as etiquetas o que faço?
-
Manda essa pessoa pastar já que ela está a ser burra.
- E
se me quiser revistar o interior do traje?
-Você recusa e justifica que perante assédio faz queixa na polícia (e faz
mesmo), além de ser norma anti-praxe.
Nota:
o que aconselhamos é que não tirem a etiqueta do traje, apenas e só pela
garantia que conferem ao mesmo. Se por uma qualquer razão pretenderem fazer um
arranjo ao traje na casa onde o compraram, convém ter a prova de que foi lá
adquirido e a etiqueta existe precisamente como garante de tal (não bastando o talão de compra).
[1] In grupo
"Tradições Académicas&Praxe" do FB [em linha], tópico "Praxe
da etiqueta", em 26 de Outubro de 2014.