segunda-feira, outubro 27, 2014

Notas ao Traje e praxistas das Etiquetas


 
Hoje debruçamo-nos sobre essa moda, a ganhar contornos de histeria colectiva, que pegou de norte a sul do país, de arrancar as etiquetas do traje académico com o pretexto de ser praxe, de ser obrigatório.

 
Pasme-se, caro leitor, que a suprema estupidez atinge os mais altos limites, quando verificamos que tal vem consagrado, inclusive, em códigos ditos "da praxe". Sim, sim, falo exactamente dessa treta de documentos que são o registo inequívoco da incompetência praxística dos estudantes (quando deveriam ser o contrário).

Como dissemos, anda-se agora a perseguir, qual "caça às bruxas", as etiquetas do traje, havendo até quem tenha a distinta lata de passar revista ao interior do traje dos estudantes.

Quem percebe minimamente do assunto ficará em choque. Revistar o interior do traje?
Pois é verdade, lamentavelmente.

 É só mais uma argolada a somar a outras do género, a lembrar o que há uns anos largos sucedeu pelos lados da Universidade de Aveiro, em que diziam aos estudantes que tinham de usar a roupa interior com logótipo da Associação Académica (que a própria venderia: boxers, t-shirts, meias....) ou então o que ainda até há pouco tempo (hoje já não, creio) sucedia no ISEL, em que o código determinava a proibição do uso de soutien preto.

 
Claro está, que tudo isto releva de ridículo papismo e exagero e que de Praxe nada tem, e muito menos de senso.

 Mas mais: há, em certos "burgos" quem faça da revista ao traje uma espécie de prova, de teste, podendo inclusive chumbar na praxe se a avaliação for negativa.

 
Mas como pode um burro vestido de traje certificar a conformidade do porte correcto de outrem, ao violar dolosamente a própria Praxe, quando vai além do permitido?
E que autoridade tem seja quem for para "chumbar" ou "reprovar" alguém em praxe? Mas anda tudo doido?
Mais adiante explicamos esse erro de revistar pessoas dessa forma.
De toda a maneira, sobre essa perfeita idiotice anti-praxe de avaliar pessoas em praxe, o melhor é lerem AQUI.

 
QUAL A RAZÃO AVANÇADA PARA PROIBIREM ETIQUETAS?

 

 Quem ainda se pergunta por que razão se anda a proibir o uso de etiquetas e a mandar que seja retiradas tem resposta simples:

Alegam que sendo o traje para igualizar os estudantes, as etiquetas estão a ir contra essa ideia, e por isso é preciso retirá-las.

 

A VERDADE E OS FACTOS
O MITO, A MENTIRA DO TRAJE IGUALIZADOR

 
É pois o argumento do traje que serve para tornar todos iguais que serve de pretexto para atacar as etiquetas, estejam elas à mostra ou não (para alguns importa é perseguir e pensar depois).

 
Uma vez mais, e por mais que tentemos desmistificar, ainda encontramos gente que parece viver num enclave onde se alimentam de ignorância e parecem impermeáveis ao saber e ao mundo que os rodeia.


Assim, ainda há quem defenda e ache que o traje existe para igualizar os estudantes, para impedir diferenças entre ricos e pobres.

Mas na verdade, o argumento está errado:

O TRAJE NÃO SERVE PARA IGUALIZAR E NUNCA TEVE ESSE PROPÓSITO.

 Já o comprovámos aqui neste blogue e por isso escusamos aqui repetir o conteúdo.
Podem aceder à explicação cabal, clicando AQUI.

 Se as etiquetas eram tiradas com base no argumento nivelador e de igualdade, pois fica sem tapete para se manter de pé.

 De acordo com o que comprovamos sem margem para dúvidas, e como Eduardo Coelho dizia sobre a questão, "seguindo a lógica formal de Aristóteles, de uma premissa errada não se pode extrair uma conclusão verdadeira.
Ora se a premissa "O traje serve para igualizar os estudantes" está errada, pelo que o resto do raciocínio, por mais bem elaborado que esteja, assenta num princípio errado - logo só pode chegar a uma conclusão errada."

 

O ERRO DE REVISTAR O TRAJE NA PROCURA DE ETIQUETAS

 
Como atrás prometemos, vamos agora lá pensar sobre essa coisa de revistar o traje e do abuso que é revistar o seu interior.

Sendo o Código de Praxe de Coimbra o mais antigo (data de 1957), estará, por isso, mais perto da fonte que o inspirou, o mesmo se passando, no caso do Porto, para o projecto de código assinada por Balau e Soromenho, em 1983, com base no de Coimbra, o que dizem eles?

  • Sobre passar revista ao traje - proibem determinantemente revista ro interior do traje, apenas sendo permitido revistar o que está á vista e sem tocar.
  • Arrancar etiquetas - Nada referem. Por isso não é da Praxe ou Tradição a obrigação de arrancar as mesmas. Não proíbem que se tire, mas não apoiam que se arranquem com a justificação de ser Praxe.

 
E se quisermos recuar aos documentos de cariz "normativo" anteriores ao Código de 1957, nenhum deles refere a permissão de revistar o interior do traje (proíbem-no, aliás) e muito menos que é da praxe arrancar etiquetas ou sinais visíveis e diferenciadores entre trajes.

 
Mas pode o leitor consultar o "Palito Métrico (1746) e Correlativa Macarronea Latino-Portugueza (1765)", de Antonio Duarte Ferrão, (pseudónimo do padre João da Silva Rebello), as "Leis extravagantes da Academia de Coimbra, ou Código das muitas partidas", de Barbosa de Carvalho (1916), e "As Praxes Académicas de Coimbra", de Dinis de Carvalho, Pereira da Mota e Sousa Ribeiro (1925) que são reconhecidamente os documentos que registam a praxis e suas regras ao longo da história. E faça o leitor igual com o  "In Illo Tempore" de Trindade Coelho ou qualquer outro documento de referência sobre Tradições Académicas.

 
Agora, cito (uma vez mais) o meu ilustre colega de bancada aqui do N&M, o professor Eduardo Coelho, a propósito da revista e da caça às etiquetas:

 
"Ora ninguém pode revistar no traje de outrem mais do que lhe é dado observar sem tocar.
A praxe prevê uma dose de reserva individual que não pode nem deve ser ultrapassada.
Esta questão do interior do traje é um princípio mais antigo do que qualquer código. É pura questão de bom-senso. Ninguém tem o direito de expor misérias alheias.
Ora se um indivíduo me aparece trajado, partindo do princípio de que não aparece com a roupa vestida do avesso, não tenho hipótese de ver-lhe as etiquetas. Ninguém tem autoridade para mandar outrem tirar o traje - não há código que o sustente, defenda, preveja ou autorize.
(...)
se as etiquetas não são visíveis, não há forma de saber se o teu traje é mais caro do que o meu -a não ser que, para ver as etiquetas do teu traje, eu violente primeiro um princípio básico de praxe: a reserva da privacidade que nem mesmo um veterano pode violar.
E eis a razão pela qual não faz sentido arrancar as etiquetas.
(...)
Não está em causa o tirar ou não, mas obrigar os outros a tirar e afirmar quer isso é praxe - e pior, revistar os trajes dos outros à procura de etiquetas. Isto não só não é praxe como é um atentado à própria Praxe. "[1]

 

Como está bom de ver, não há base alguma que sustente o retirar das etiquetas como sendo praxe, como sendo obrigatório, muito menos ter a ousada estupidez de revistar a roupa das pessoas.

E pena é que sejam precisamente os líderes dos organismos de praxe e seus ajudantes de campo os primeiros a alimentar a praxe não com rigor e exemplo de saber, mas precisamente com a sua incompetência total e absoluta.

 E o resto dos ignorantes vão atrás disso, fiando-se naquilo que o colega, o amigo ou veterano lá do bairro lhe diz (ou porque têm essa pessoa em boa conta, ou porque ela têm o poder para impingir tal treta, na base da sua hierarquia), porque vale mais o "diz que disse" do que provas sérias e concludentes.

Uma vez mais, são os organismos de praxe o veículo de disseminação dessa doentia obsessão, promovendo-o e/ou permitindo-o, para vergonha de todos, desde logo porque contraditório do nível intelectual exigido a quem cursa o ensino superior.

 

 - Mas é proibido arrancar as etiquetas?
- NÃO, não é!
- Então posso arrancá-las?
- PODE, mas nunca por obrigação, por ser praxe ou norma.
- Se me mandarem tirar as etiquetas o que faço?
- Manda essa pessoa pastar já que ela está a ser burra.
- E se me quiser revistar o interior do traje?
-Você recusa e justifica que perante assédio faz queixa na polícia (e faz mesmo), além de ser norma anti-praxe.

 

 

Nota: o que aconselhamos é que não tirem a etiqueta do traje, apenas e só pela garantia que conferem ao mesmo. Se por uma qualquer razão pretenderem fazer um arranjo ao traje na casa onde o compraram, convém ter a prova de que foi lá adquirido e a etiqueta existe precisamente como garante de tal.

 

[1] In grupo "Tradições Académicas&Praxe" do FB [em linha], tópico "Praxe da etiqueta", em 26 de Outubro de 2014.

1 comentário:

Anónimo disse...

Vou falar de forma seria, ri mesmo quando vi que é praxe ter de retirar etiquetas, mas isso é uma estupidez! Graças a Deus que ninguém me disse coisa tal, se não o "Manda essa pessoa pastar já que ela está a ser burra" era apenas um elogio positivo que fazia a tal pessoa.
Outra coisa, passar revista, só se estivesse no serviço militar...

Estudo em Leiria e apenas retirei a etiqueta da minha capa com o propósito de não ser bonito estar a ver-se.