Um texto que retoma a idieia vicentina de "Ridendo Castigat Mores".
Para bom entendedor.......
No
Bairro da Tradição, encontra-se o edifício da Praxe, com várias dezenas de
condóminos e suas famílias.
Dois
elevadores servem o prédio e tudo parece correr naturalmente, naquele pacato
bairro.
O
problema é que nas escadas do prédio têm aparecido coisas bizarras e mal
cheirosas.
Com efeito, parece que alguns condóminos mais aflitos ou "sonâmbulos" têm feito do vão (e degraus) das escadas
o seu sanitário, mas como são raramente usadas, a coisa tem passado
algo despercebida (ou pelo menos tem sido ignorada, pois obrigaria a incómodos, desde logo limpar ou denunciar os vizinhos - quando todos querem "boa vizinhança").
No
outro dia, a D. Júlia, que é a funcionária do CTT que distribui o correio, teve
de entrar para entregar uma encomenda no 10º andar. Como é claustrofóbica,
utilizou a escadas para cumprir a sua tarefa.
Qual
não foi o seu espanto, quando, ali-acolá, num ou noutro ponto mais escuro,
descobriu aquelas “alheiras”. Tinha-lhe cheirado a algo “esquisito”, mal abrira a
porta de acesso à escadaria, mas nunca imaginara que ali faria tais
descobertas.
D.
Júlia, há que o dizer, é uma grande quadrilheira e faz do mexerico a sua
segunda especialidade, logo a seguir à confecção de tartes de maçã.
Claro
está que, em poucos dias, toda a vizinhança sabia do caso, tornando-se alvo de
chacota até nas reuniões da paróquia, do clube de caça e pesca ou no
supermercado. E não se fizeram esperar as piadinhas do costume aos moradores do edifício.
Tal
alvoroço pôs em pé de guerra o prédio em causa e foi marcada assembleia geral
de condóminos.
Olhando
para a acta lavrada dessa reunião foi possível perceber que:
Muitos
condóminos pretendiam processar a D. Júlia por difamação.
Outros,
por sua vez, diziam que as poias eram rareadas, só num ou noutro sítio, e que,
comparando com a larga maioria dos degraus e patamares limpos, não havia razão
para alarme.
Um
ou outro, mais afoito, reclamava que, como quase todos usavam elevador, isso não
prejudicava ninguém e que o problema era tão só dos condóminos que não cumpriam
a tarefa de limpar também as escadas (ficando-se apenas pela porta de entrada,
elevadores e patamares dos elevadores).
Muitos
também diziam que nunca lhes tinha cheirado mal a eles, pelo que não percebiam
que cheirasse mal aos de fora.
A
culpada de tudo isso, pelos vistos, era da D. Júlia ou de quem quer que fosse
de visita ao prédio e usasse as escadas.
Defecaram
nas escadas do prédio da Praxe, mas, e segundo a acta da reunião, apenas 2 ou 3
condóminos discordaram, mostrando-se, isso sim, indignados por haver moradores a
cagar nas escadas.
Só
esses 2 ou 3 é que não percebiam como podia, a
tantos, não lhes fazer diferença aquele cenário (e a imagem que isso dava
do prédio e moradores), e como já nem o cheiro era incomodativo (um odor apenas
disfarçado, enquanto as portas de acesso às escadas se mantivessem fechadas).
Só
esses 2 ou 3 moradores pretendiam descobrir quem “obrava” no seu prédio, porque
as escadas, afinal, eram parte dele.
Foram
vozes logo abafadas pelos demais condóminos.
Aquilo
era um caso isolado; não eram assim tantos “coisos” e o cheiro, esse,
tratava-se com um desodorizante ambi-pur adequado. Não era hora de divisões, mas de se unirem contra quem falava mal do prédio.
Importava
era tratar da D. Júlia, conhecida língua de víbora que estava a exagerar, que
preferia ver as 5 ou 6 poias sem olhar aos milhares de degraus limpos.
E
tudo porque, em tempos, a D. Júlia tinha contado numa reunião da tupperware que,
no prédio, as pessoas acumulavam os sacos lixo à porta de casa, para só ao fim
de 2 ou 3 sacos o irem colocar nos caixotes defronte ao prédio. Ela, afinal, é que perseguia o prédio que já tinha má fama por causa dela.
A
D. Júlia é que era a culpada de tudo e da má imagem do prédio, mesmo se era
verdade que várias pessoas no bairro já sabiam (e comentava à boca pequena) da
falta de higiene que por lá se registava.
Estranhamente,
dessa acta, nada sobre limpar “aquilo”, nem mesmo contratando uma empresa de limpeza.
Já “limpar
o sebo” à cusca da D. Júlia, isso, sim, era imperativo e foi votada a marcação de uma reunião extraordinária e uma comissão para a liderar e apresentar medidas.
Chegou a haver uma vigília, com vela e tudo, à porta do prédio, por parte dos condóminos e famílias. Foi tudo filmado pelo filho da D. Deolinda, que trabalha na loja de informática, que o colocou de imediato no FB e youtube.
4 comentários:
Um texto excelente. Pudera que muitos mais pudessem ler isto e abrir os olhos, tanto ao sensacionalismo da televisão como à defesa cega que certos "praxistas" mandam em resposta.
Simplesmente espetacular.
Adorei ler este texto.
Diz bem daquilo que se passa na Praxe. As pessoas não assumem os problemas que existem e desculpam-se que não são a regra.
Ninguém quer limpar nada mas apenas dizer que não foram eles a fazer asneira mesmo quando é feita na sua própria academia.
Está tudo neste texto: os que preferem a porta fechada para não se saber, os que preferem entrar em negação, os que se desculpam com o facto de ser uma excepção, os que acusam a televisão de ser culpada, os que se acham vítimas de uma cabala dos mídia e os que fazem manifestações e criam grupos de facebook para defender a praxe mas não mexem uma palha para a melhorar.
Mais um texto sensacional deste blogue.
Vale mais do que um like, vale muitos aplausos e partilhas.
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